A Medida Provisória (MP) 927/2020, editada pelo presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), na noite de domingo (22), criou um mal-estar generalizado no meio político e social, por causa da edição de um artigo que permitia aos empregadores romper contratos de trabalho por quatro meses, sem dar ao trabalhador garantia nenhuma de recebimento.
A pressão foi enorme e o Planalto teve que editar no dia seguinte uma nova MP, a de número 928/2020, que suprimia o artigo polêmico.
Entretanto, a nova MP trazia consigo outro artigo bastante polêmico: o que permite que o empregador demita o funcionário que estiver infectado com o Covid-19.
Artigo da MP
O artigo 29 diz que “os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal”.
Ou seja, o contágio do Covid-19 não será considerado acidente ou doença de trabalho, exceto quando o trabalhador conseguir comprovar que a contaminação aconteceu durante o trabalho. Caberá ao trabalhador essa prova.
O portal UOL, diz que “segundo especialistas trabalhistas ouvidos pela Repórter Brasil, a relação entre a doença e o ambiente de trabalho é um dos poucos casos hoje em que o trabalhador possui garantia de estabilidade no emprego — após retornar da licença médica, ele não pode ser demitido durante 12 meses”.
“Ou seja, ao dificultar a responsabilização da empresa, o governo abre a porta para a demissão justo em um momento de possível crise econômica generalizada”, diz a reportagem.
Dificuldade de comprovação
Valdete Souto Severo, da Associação de Juízes para a Democracia, lamentou a MP e afirmou ao portal que “todas as pessoas que não têm escolha de parar de trabalhar, como um porteiro, terão que comprovar que adquiriram o vírus no trabalho. Mas é complicado comprovar, porque é uma doença viral, e o corpo elimina o vírus depois de um tempo”.
O próprio ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS), na sexta-feira (2), decretou transmissão comunitária do coronavírus em todo o território nacional.
Transmissão comunitária é quando não é possível rastrear quem infectou quem.
Números no Brasil
Está cada vez mais difícil saber quem pode ser o transmissor da doença.
No país, todas as capitais e centros urbanos impuseram restrições à circulação e aglomeração de pessoas, fechamento de comércios não essenciais e paralisação de transporte coletivo. Mesmo assim, o número de infectados só cresce.
Já são, segundo levantamento do meio-dia de quarta-feira (25), das 27 secretarias estaduais de saúde, 2.280 pessoas com o vírus e 48 mortes decorrentes da doença. Com a subnotificação, podem ser mais.
Nesse sentido, sindicatos e entidades ligadas à defesa do trabalhador estão preocupadas em como o demitido poderia provar onde foi infectado.
“Esse artigo da MP mostra para quem a lei foi feita: para a classe patronal. É como se o governo estivesse dando um salvo-conduto para a empresa: ‘coloca esse trabalhador em exposição'”, lamentou Valdete.
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